domingo, 17 de julho de 2016

FOLHA: UM JORNAL A SERVIÇO DO GOLPE

Quarto mês,
Ano I do Golpe de Estado: ditadura de Michel Temer

 Otávio Frias,  fundador da Folha: tradição é uma coisa importante.

Não se sabe, ainda, a natureza da tentativa, digamos, "falhada" de golpe na Turquia (vocês certamente lembram do atentado ao aeroporto de Ataturk, em Istambul, faz um mês), assim como se deve perceber que o Brexit pegou muitas pessoas de surpresa, incluindo um monte de britânicos que supunham que seus conterrâneos teriam maior bom-senso; e que o atentado em Nice vem em boa hora para ampliar o sentimento já bastante exacerbado na Europa (& elsewhere, basta ver o caso de Trump nos EUA) de xenofobia, estilo anos 1930, que, é óbvio, vai desaguar em algo similar àquilo em que desaguaram os anos 1930, em breve, & que pessoas graúdas vão ficar ainda mais ricas negociando nessa waste land, como aconteceu também antes.

É o óbvio ululante de Nelson Rodrigues.

Esquemão básico, pura cartilha: quando o sistema de privilégios estiver em colapso, montar uma crise econômica, espalhar todo tipo de medo via mídia (doenças pandêmicas, violência urbana incontrolável, instabilidade econômica incidindo sobre os empregos, estrangeiros de zonas pobres & de conflito infestando o nosso país, o perigo vermelho dos comunas, etc), & colher o fruto doce do caos no chacoalhar das bolsas antes imóveis.

Embora a cartilha seja muito simples observando-se como se descortinam os eventos, nada saberemos sobre as coisas em sua origem, urdidas em bastidores que a maioria de nós sequer pode imaginar, atendendo a interesses cujo volume financeiro extrapola o PIB de uma porção de países, somados. Parafraseando Trevor Broom (John Hurt) no filme do Hellboy: nós vemos a marionete, mas onde está o manipulador da marionete?

"I see the puppet, but where is the puppeteer?"

Podemos no entanto (& devemos) fazer perguntas consistentes ao ver a marionete, aquilo que é criado, como num espetáculo de mágica, para desviar o nosso olhar, a nossa atenção, para um lugar conveniente, de modo que o truque passe despercebido. 

Isso é o que pessoas com alguma inteligência devem se fazer, as boas perguntas.

Uma delas seria, & bem interessante: os atentados do chamado Estado Islâmico estão atendendo a quais interesses? Ou, ainda melhor: quem sai efetivamente ganhando com os atentados do Estado Islâmico?

A resposta inteligente a essa pergunta aterroriza mais do que os próprios atentados. E essa resposta deveria, claro, orientar as avaliações do que tem havido no mundo nos últimos anos, & certamente explicaria por que a grande mídia, aqui & em outros lugares, tem feito o que em inglês se chama hate mongering, ou o incitamento ao ódio. 

Como o mágico, desvia-se o olhar para um lugar conveniente. A rainha Elizabeth, de Inglaterra - a primeira rainha daquele nome e rainha de fato, não a representante do atual parque temático inglês - disse em discurso ao Parlamento, de 1586, que "we princes, I tell you, are all set on stages" (nós, príncipes, estamos todos sobre palcos), relembrando àqueles que a ouviam que era fundamental produzir aos olhos do público uma imagem conveniente, guiar o público na direção desejável.

"Você sabe, Mestre William, eu adoro uma boa peça".

Conveniente & desejável para quem? 

Essa é uma outra pergunta, que deixo à discrição da leitora & do leitor, que certamente saberão respondê-la. 

Mas fiquemos num esquema pro domo, vamos cultivar um pouco o nosso jardim, como aprendeu até o tolo Candide, de Voltaire. Até porque o nosso jardim é vítima, no momento, de uma tremenda praga de ervas daninhas. 


Il faut cultiver son jardin

Quem está nos pregando uma peça? Vejamos apenas um caso exemplar.

A Folha de São Paulo, que se propagandeia como "Um jornal a serviço do Brasil", seria mais honesta se se dissesse "Um jornal a serviço do Golpe". Qual golpe? Ora essa, basta escolher, serve qualquer um deles, como vocês vêem acima Otávio Frias lambendo as botas do ditador, no caso, o General Emílio Garrastazu Médici. 

Hoje a Folha publica uma "pesquisa" do universalmente conhecido como Datafalha, composta com um objetivo claro. A pergunta ingênua que se fez é sobre o que seria melhor para o Brasil, Temer ficar, Dilma voltar ou fora com os dois? Em abstrato, parece uma pergunta limpinha, pura curiosidade de resto jornalística & sociológica.

O mesmo Datafalha, no final de 2014, sem interesse nenhum, dava que a intenção de voto se inclinava para Aécio Neves, repetidamente pondo o candidato do PSDB em primeiro nas pesquisas. Outros veículos de mídia, que sempre foram mais abertamente a serviço do pior, como a Veja, não ficavam no esquema sutil de "pesquisa".

Vocês, é claro, se lembram dessa singela capinha aqui (lamento postá-la, sei que é repugnante, esteticamente horripilante & dá vergonha alheia, me desculpo desde já, mas é pela sanidade do argumento):

O poder de Aécio ser mencionado em várias 
listas de delação da Lava Jato, talvez? Isso 
seria bom jornalismo, claro.

A pesquisa não colava, claro, porque Dilma Rousseff seria mesmo reeleita presidente, & na última hora, enfim, apareceu que ela estaria na frente. 

Agora há um timing sendo retomado pela mídia: aproxima-se o dia da, ah-ham,  "votação" no Senado, que como sabemos é uma das instituições fortes & honestas do Brasil, & que zela pela democracia & pelo que é justo. Em Roma, o esquema foi o de um monte de punhais & Júlio César, apunhalado, dizendo pra Cristovam Buarque, "tu quoque?". 

Perdão, me enganei: era Bruto, não Buarque.

Esse timing viu surgir alguns problemas na narrativa de legalidade da peça ridícula do Golpe, que custou aqueles 45 mil dinheiros pra legenda 45 (não sei quanto isso dá no câmbio de Judas Iscariotes, mas podemos perguntar pro liliputiano Temerária, ele sabe), que gastou também com o MBL, o Movimento dos Boçais Lambedores. Aqueles que saem com a camisa da CBF, outra instituição idônea.

Os problemas graves para o Golpe: a perícia técnica do Senado inocentou Rousseff. Não só, para piorar tudo, o Ministério Público acaba de inocentar Rousseff. Chovem no molhado, porque sabe-se que Rousseff é inocente desde antes da pataquada começar com aquele dia na memória da infâmia universal, o 17 de abril de 2016.

Muito pior ainda. Olhem o que está havendo no exterior:

Manifesto de parlamentares franceses publicado no Le Monde:
"Dilma Rousseff é vítima de uma baixa manobra parlamentar".
Leia aqui em português.

Deputado Alan Grayson, 
denunciando o Golpe brasileiro em Washington: 
"democracia importa".

Inocente. Muito bem: como justificar agora o Golpe? A Folha de São Paulo corre ao socorro. 

Se a pesquisa do Datafalha (sempre errando no que interessa, como os antigos pintores caprichavam no retrato de seus nobres senhores feíssimos) mostrava antes que 60% queriam que Temer fosse chutado de seu trono usurpado (& escrevam o que digo: 60% era um número que já enfeitava o retrato feio demais para ser publicado convenientemente pelos capachos), agora 50% quereriam que ele ficasse.

Ah, é?

Isto aqui não existe, ok?

Nem isso: nunca aconteceu

Não, não soubemos disso aí

Não vimos nada, nada. Na Globo, jura?

Fica Temer?  Onde? 

Só no Datafalha, porque nas ruas, nos shows musicais, nos teatros, na FLIP, no exterior, nas divertidas entradas ao vivo da comparsa do Datafalha, a TV Golpe, em qualquer lugar onde você for, só dá FORA TEMER.

A Folha, como toda mídia de massa no Brasil, é pró-Golpe, como a jornalista Sue Branford demonstrou - abaixo, na postagem anterior, do vosso Demônio. Foi pró-Golpe de 1964, como vimos acima, & eis aí a demonstração, também, de que velhos hábitos não são fáceis de largar.

O melhor: o que está pressuposto é a aberrante legitimidade que se arroga no lugar da democracia dos 54 milhões de votos que elegeram Dilma Rousseff. É como se dissesse: "ah, então é o  que o povo quer". Mas respeitar o que as urnas disseram, o modo efetivamente legítimo de se ter uma democracia, o legítimo "o povo quer", não, isso não, se der o contrário do que queríamos.

Mais duas imagens, que valem mais do que mil palavras & 45 mil reais, sobre como a mídia cozinha sua mentira conveniente. 

Isto aqui é o golpista dando as caras, por assim dizer:

"Senhor, o senhor é baixo, mas o povo ainda está vendo"

E isto aqui é Rousseff:


O Datafalha? Honestamente, nem acho que preciso dizer mais nada. 

Livros de História & pesquisadores terão um prato cheio de vermes ao estudar este nosso período. Os golpistas, reduzidos única & exclusivamente, hoje, ao não-argumento: querem porque querem Rousseff fora.

"Fora", diriam eles, "e leve junto a democracia".

ADENDO (19/07/2016):

O JORNALISTA ESTADUNIDENSE GLENN GREENWALD, DE THE INTERCEPT, DEMONSTRA QUE A FOLHA PRATICOU FRAUDE NA PESQUISA PARA AJUDAR O GOLPISTA MICHEL TEMER:

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