segunda-feira, 14 de agosto de 2017

"NÃO SEJA UM OTÁRIO", DIZIAM OUTROS ESTADOS UNIDOS

Décimo-sétimo mês,
Ano II do Golpe de Estado: ditadura de MiSheLL Temer


Não, isso aqui não é a Guerra Civil do século XIX: isso
aconteceu no último fim de semana, em Charlottesville, Virginia,
& deixou saldo de mortos & feridos, além de um testemunho sólido
da volta do fascismo, defendida em solo estadunidense como
"o direito de livre expressão", que não vê contradição alguma
com a criminalização da discriminação & do discurso de
incitamento ao ódio.


A coisa, que já estava feia, rapidamente fica pior.

Pode ser surpreendente (& é) que brancos com tochas tenham feito uma marcha, livres da polícia, livres de qualquer constrangimento, gritando o lema nazista “blood and soil”, entre outras violências; mas é muito mais surpreendente que, depois da violência que esse ato ilegal gerou, uma quantidade maior de estadunidenses tenha defendido os nazistas que defendiam a permanência da estátua do perverso general Lee na cidade.

Disse “ilegal” porque é ilegal pelos Atos dos Direitos Civis discriminar alguém por raça, o que constitui um crime, & é precisamente o que faziam; ilegal também pelo incitamento ao ódio, que também era abertamente o propósito da marcha, do simbolismo das tochas, das suásticas,  do reclamar o país todo apenas para um grupo sob o argumento nazista da "pureza" da "raça", etc.

(E seria até curioso perguntar-se por que a polícia não estava em parte alguma. Aqui no Brasil, se pessoas pacificamente protestarem a favor da democracia que nos foi roubada, a polícia tem sempre um presente de violência com que brindar o povo. Nos EUA, pessoas cometendo atos explicitamente criminosos de discriminação, & visivelmente preparadas para violência até física - se assim se determinar - deixam que façam seu incitamento ao ódio sem o menor constrangimento, em silêncio conivente).

Mas não creio sequer que fosse necessária a ilegalidade jurídica para se saber que aquilo deve ser coibido: basta você ter um mínimo de respeito pelo outro, pela diferença. Basta um mínimo de empatia (aquilo que se diz que os psicopatas são incapazes de ter), a noção de que a discriminação é uma brutalidade anti-humana. Aliás, tem havido, desde sempre, um esforço coletivo de livrar a humanidade disso, sabidamente uma desgraça.

Detesto estar certo sobre coisas horripilantes com tanta freqüência & antecipação: no Brasil, previ que haveria um golpe, não por algum poder sobrenatural, mas porque estava escrito no crescente fascismo da sociedade brasileira, incitada pela mídia de massas, que era isso o que haveria; depois, escrevi aqui mesmo que os sintomas não eram visíveis apenas no Brasil, mas no mundo, os sintomas de uma nova era fascista.

Aí está, se alguém precisava de mais explícita confirmação.

E Charlottesville, a espantosa reação favorável aos supremacistas brancos está longe de ser o ponto mais horripilante que esses desenvolvimentos dos últimos 17 anos terão. Isso é só o começo, já vou avisando também: porque assim como não se dá um golpe de estado para se ficar no poder apenas 2 anos (coisa que qqer brasileiro já deveria saber desde 1964, ao menos), também não se observa esse nível de ódio na sociedade sem que se produza como resultado um banho de sangue de proporções enormes.

Por mais estranho & inacreditável que possa parecer, hoje a sociedade ocidental quer um novo horror do tamanho da Segunda Guerra Mundial, ou pior, para purgar sua sede de sangue, obviamente latente no bicho homem, mas alimentada a todo minuto pela mídia nos últimos 17 anos. Sim, usei o verbo “querer”, porque quer, & tem ganas de.

Imagine como é simples perceber isso: basta você, numa conversa informal num grupo de pessoas, defender o direito de todos, incluindo os mais pobres. Imediatamente o grupo se fecha, acusa você de bolivariano, comunista, totalitário; porque, como sabemos, é totalitário defender o direito de todos, & não o dos grandes privilégios. 

E o privilégio virá se justificar com o discurso de “meritocracia”, supondo-se duas coisas, naturalmente: 1) quem quer que tenha privilégios é porque se trata de fruto do mérito (que freqüentemente é o mérito de já nascer numa classe muito alta ou, lá chegando, agir de todos os modos para que a gigantesca concentração de renda permaneça exatamente assim); 2) quem não os tiver, melhor morrer.

E podem me perguntar: “Ok, se você acha isso, por que é que fariam uma coisa dessas?” Penso que seja simples, a resposta. A violência desencadeada desse modo atinge poucas pessoas privilegiadas (basta ver quantos privilegiados perecem, proporcionalmente, numa situação dessas), o grosso dizimado é na verdade de pessoas muy comuns no jogo financeiro, miseráveis, pobres & de classe média, que são a bucha de canhão das guerras, das ditaduras.

Alista-se sempre, é claro, o desafortunado, porque é uma política, como tantas, de puro & simples extermínio do indesejado. No Brasil isso é visível na Guerra do Paraguai, na ditadura militar, nas chacinas de periferia.

Os privilégios daquela mais estreita minoria mundial criam esse circo toda vez que sentem, pelos números, que a balança pode virar & começar a reduzir sua força financeira desproporcional: quem tem demasiado pretende continuar assim, porque ter demasiado não é ter demasiado apenas para seus já insanos apetites, é para deixar para suas dezenas de gerações futuras, & manter a coisa desse modo, o mais imóvel possível.

Para qualquer um que observar como o mundo tem se comportado, é óbvio que um discurso generalizado de ódio, desconfiança, preconceito, estupidez gratuita & insanidade tem sido o que políticos de extrema direita (voltando a ser protagonistas de um mundo que parecia seguir na direção de se livrar para sempre disso), tagarelas televisivos & suas versões mais modernas na internet, nas redes sociais, têm feito sem parar.

E a internet, com seus desdobramentos hipnóticos nos fones móveis, espalhou a coisa com mais eficiência, porque estupidez é legião, & ao perceber que estão em muito maior número do que imaginavam, os utradireitistas que apenas resmungavam nas poltronas ou quando se encontravam nos pequenos grupos que acolhiam seu desejo de controle dos outros, se tornaram felizes & fortes, porque esse é o tipo, como prova a história, que se sente melhor se acompanhado de uma multidão igualmente hidrófoba gritando slogans de segregação, como assistimos lamentavelmente no passado, & seremos obrigados a reassistir agora.



Um documentário recente, como I am not your negro (2016), retomando as lutas pelos direitos civis através de texto & imagens de James Baldwin, que lutou ali em meio a Malcolm X e Martin Luther King (os dois, lembremos, acabaram assassinados), torna tudo ainda mais extravagante: porque uma sociedade que chegou ao ponto de maturidade de recordar aquele momento dramático na voz de um de seus mais humanos & articulados agentes deveria notar, coletivamente, que está dando passos enfáticos para trás.

Só que não.

O ódio de classe (mas também de contextos de cor & misóginos) levou ao golpe de estado no Brasil, em 2016; um ódio que também é de classe, mas é sobretudo um ódio ainda mais regressivo, contra a existência da mera diferença, retorna nos EUA e na Europa. No Brasil, pela primeira vez de modo explícito, ganha um sentido semelhante na figura grotesca de Bolsonóia, o candidato dos nazistas brasileiros, que já estão longe de ser minoria, ainda que a franca contradição nos termos devesse desencorajar os menos idiotas; nos EUA e na Europa reacendem-se as tochas da Inquisição, dos Ku Klux Klowns (como disse, indignado, o vice-prefeito de Charlottesville) & do nazismo.


Tem gente ajudando o Bolsonóia & seus nazistas
brasileiros (vai entender isso): um doce praqueles
que souberem dizer quem ajudou a derrubar um
governo de pessoa honesta, democraticamente
eleita, & apoiou um golpe de estado do ódio 
de classe, de cor & misógino, & pretende
sabotar as, ah-ham, eleições de 2018 com a ajuda
de um juiz camicia nera.

Tem gente achando que não é nada, uns eventos isolados sem maiores conseqüências. Não tem problema: voltamos a conversar em mais alguns anos & daí vocês me dizem o que acham.

O maior perigo é sempre não agir quando a coisa está começando, porque agora já está tomando um tamanho difícil de controlar & tem chegado até governos nacionais. Quando houver um grupo de alguns governos nacionais poderosos, & de extrema-direita, eles darão as cartas. E daí não haverá nenhuma solução que não custe décadas & o sangue de muitos milhões de pessoas.

E daí as pessoas tontas se perguntarão, como sempre fazem: “como chegamos a isso?” Está bastante óbvio, tem já 17 anos de construção.

Mas já que parece haver uma demanda por algum entendimento mais simples & ilustrado do assunto, algumas pessoas têm lembrado que houve um filme estadunidense muito educativo sobre como perceber um discurso de ódio, suas implicações & conseqüências. O discurso fascista, & como ele vem enfeitado.

Don't be a sucker (Não seja um ótário, 1947) vem a calhar hoje, quando otários caem como patinhos (patos que depois vão mesmo pagar, embora digam que não) numa conversa velha &, pior, burra. Se diz no vídeo: "America IS minorities". Este aqui vídeo aqui:


Don't be a sucker ("Não seja um ótário", 1947, made in the USA,
oh boy, & não por comunistas, nem bolivarianos, nem muçulmanos,
nenhum desses tipos maus contra nazistas bonzinhos que só querem 
devolver o seu país a você, dono dele por direito de sangue & de solo).
Infelizmente, o vídeo breve & simples virou de novo um manual
necessário para a educação contra as massas sedentas de sangue,
no Brasil, também.

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